domingo, 25 de janeiro de 2015

Aracati: Sem regulamentação nem controle, segurança depende de praticantes

Poucas das atividades de aventura existentes no litoral seguem as normas definidas pelo poder público




O litoral cearense é conhecido por unir, dentre outros atrativos, a beleza das paisagens ao entretenimento proporcionado, em especial, pelos esportes de aventura. Por toda a orla, há espaço para o kitesurfe, jet ski, o passeio de bugue, o voo de parapente. Tudo para quem gosta de lazer com um pouco de emoção. No entanto, todos são atividades que, por natureza, já oferecem riscos, e, se realizadas sem a competência e o cuidado necessários, deixam de ser diversão para se tornarem preocupação.

No último dia 18, uma mulher e dois homens, dentre eles um instrutor, sofreram um acidente de parapente em Canoa Quebrada, após uma rajada de vento derrubar o equipamento. Somente depois do acontecido, a Prefeitura de Aracati decidiu proibir a prática até que fossem determinadas normas no município. Nas praias cearenses, incidentes do tipo não são novidade. A falta de fiscalização e regulamentação referente à grande maioria dos esportes também não. Descasos que abriram brecha para a prática insegura. Por isso, cabe aos próprios participantes tomar as medidas necessárias e, assim, evitar incidentes.

No caso do parapente, Paulo Rocha, membro da Federação de Parapente e Asa Delta do Ceará, acredita que o episódio em Canoa Quebrada foi o resultado de uma série de irregularidades: a não utilização de capacete pelos participantes, o tempo inadequado para o voo e a presença de três pessoas em um mesmo equipamento.

Riscos

Segundo ele, a atividade, como todo esporte de aventura, apresenta perigos, mas, para que haja segurança, é preciso que os riscos sejam calculados e minimizados ao máximo.

Rocha lembra que, no Ceará, a única regra que trata sobre o assunto data de 2011 e é estadual. Conforme o texto, "as agências de turismo que operam com esporte de aventura deverão obter licenciamento específico para o exercício da atividade, nos termos desta Lei e de sua regulamentação". Segundo Rocha, os instrutores devem ser habilitados pela Federação e os equipamentos, homologados.

Mas o que se vê em vários pontos da orla é que a legislação não teve efeito. "O certo é que a iniciativa pública solicite à federação da modalidade qual é a melhor forma, quais são os procedimentos de segurança para a prática. E cabe às municipalidades, que hoje têm a gerência costeira, fiscalizar de acordo com as regras passadas", defende o representante da Federação.

Também em Canoa Quebrada e em outros pontos do litoral como Ponta Grossa, Cumbuco, Praia das Fontes e Lagoinha, o passeio de bugue é atração das mais procuradas, seja ele turístico ou de aventura. Para garantir a proteção de pedestres e dos próprios passageiros, o Departamento Estadual de Trânsito (Detran) delimitou, em 2009, os trechos do litoral por onde os veículos podem trafegar.

Autorização

"Existe uma faixa vermelha, que é de proibição. Não podemos trafegar na frente dos restaurantes, nem nos locais onde tem um fluxo grande de pessoas", explica Reginaldo da Costa, um dos diretores da Associação de Bugueiros de Canoa Quebrada. Só na região, são 66 profissionais atuando.

Os veículos adequados para o serviço têm autorização da Prefeitura. Reginaldo destaca que, antes de começarem a levar passageiros, os condutores passam por um estágio probatório. "Eles fazem um teste para a gente saber se estão seguros na descida das dunas", diz. A medida, conforme ele, é uma das formas de assegurar que não haverá problemas durante o trajeto. Fora isso, a Associação de Bugueiros ainda tem restrições quando à quantidade de pessoas por bugue e a presença de crianças.

Nas principais praias, o controle do Detran é mais rigoroso. No entanto, o diretor afirma que as ações não são constantes em toda a orla. Por conta disso, surgiram empresas "piratas", que não são cadastradas oficialmente. "Tem carro que não obedece. Eles não seguem as mesmas exigências que a gente, o que acaba aumentando o risco para os passageiros. Por isso, recomendamos que sempre procurem as associações", afirma.

Desrespeito

No mar, qualquer prática requer o dobro de atenção. Hoje, é comum encontrar banhistas dividindo espaço com adeptos do kitesurfe e condutores de jet ski, as duas mais populares atividades nas águas do litoral.

Embora, nas praias, o uso de motos aquáticas seja indiscriminado, as normas são bem definidas. Segundo o tenente Francisco do Horizonte, chefe do departamento de Segurança do Tráfego Aquaviário da Capitania dos Portos do Ceará, há regras relacionadas tanto à embarcação quanto ao condutor. Esta precisa ter um título de inscrição e um termo de responsabilidade assinado pelo proprietário. Já os condutores devem ser habilitados como motonautas e possuir, no mínimo, 18 anos, além de utilizar coletes salva-vidas.

A lei ainda estabelece a manutenção de uma distância superior a 200 metros da praia para utilizar o jet ski. Mesmo assim, os flagrantes de desrespeito são recorrentes. "Para se ter uma ideia, em 2013 tivemos 67 infrações de jet ski e embarcações de esporte. Em 2014, foram 74. O que existe é o descuido. As pessoas compram a moto aquática para se divertir e não se preocupam em seguir a lei, que dá mais segurança", alega Horizonte.

Na outra ponta, está o kitesurfe. A prática, hoje, já está disseminada por quase todo o litoral. Segundo Miguel Saboia, presidente da Associação de Kitesurfe do Ceará, além de Fortaleza, onde a Praia do Futuro se tornou ponto de referência para os adeptos, as praias de Cumbuco, Taíba, Paracuru, Icaraizinho de Amontada, Preá e Jericoacoara são os locais mais procurados pelos surfistas.

Legislação

De todos, apenas a Capital possui leis para regulamentar o esporte. De acordo com o Decreto Municipal 12.247, de 2007, a prática só é permitida em três trechos da orla, desde que seja reservada uma área de 50 metros de distância da faixa de areia para a decolagem e pouso dos equipamentos. Aos domingos e feriados, o kitesurfe é totalmente vedado.

No restante do litoral, no entanto, não há nenhum tipo de norma, como lembra Saboia. "Não tem regulamentação. O certo é velejar 50 metros após a rebentação das ondas, mas justamente por não ter regras, isso não é feito na prática", afirma. O presidente da Associação defende, ainda, que, diante do crescente número de kitesufistas no Ceará, até a legislação criada pela Prefeitura de Fortaleza precisa ser atualizada. A fiscalização da atividade deve ser feita pelas gestões municipais.

Quase 3 mil infrações foram registradas

Responsável pela fiscalização dos passeios de bugue nas praias do Ceará, o Detran-CE informou que o monitoramento acontece quando há concentração de banhistas nas praias. "Por isso, as equipes fazem seu trabalho nos fins de semana (sábado e domingo), feriados e feriados prolongados", alegou a assessoria de imprensa do órgão, por meio de nota. "Desde 2009, o Detran estabeleceu as áreas de praia (do Ceará) onde os veículos 4x4 podem circular e onde não podem circular", acrescentou. A lista com os trechos permitidos e proibidos está disponível no site do órgão (www. detran.ce.gov.br).

Em 2014, o Detran registrou 2.695 infrações às determinações, cometidas tanto por bugues, como quadriciclos e outros veículos do tipo. O número foi superior ao do ano anterior, quando foram contabilizadas 2.116 irregularidades.

De acordo com o órgão, a punição para os responsáveis está prevista no Código de Trânsito Brasileiro, em seu artigo 187. A infração é considerada média e a multa equivale a R$ 85,13.

Acidentes

Sobre a fiscalização para os jet skis, o tenente Horizonte, da Capitania dos Portos, esclarece que, anualmente, entre os meses de dezembro e março, é a realizada a chamada Operação Verão, para coibir acidentes com embarcações. Segundo ele, o período delimitado é o de maior fluxo de pessoas nas praias. A Capitania informa que, no Estado, há mais de 2 mil embarcações de esporte recreio, a exemplo das moto aquáticas.

Na última edição do monitoramento, cerca de 260 embarcações foram notificadas por estarem em desacordo com as normas de segurança. Nesta operação, alguns dos pontos que ganharam reforço de fiscalização são a Enseada do Mucuripe, a Lagoa do Banana, em Caucaia, a Lagoa do Catu, em Aquiraz, e o açude do Trussu, em Iguatu. A ação vai até o dia 15 de março. As infrações podem resultar em multa que varia de R$ 40 a R$ 3.200.

Controle

Em relação à prática de kitesurfe, o chefe do departamento de Segurança no Tráfego Aquaviário afirma que o controle não faz parte das competências da Capitania dos Portos. No entanto, ele afirma que o órgão está trabalhando junto ao Ministério Público do Estado do Ceará (MP-CE) para incentivar as prefeituras cearenses a desenvolverem um plano de gerência costeira que incluia a regulamentação do esporte e, por consequência, a fiscalização dos praticantes.



Fonte: Cidade – Diário do Nordeste (25/ 01/ 15)

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