Por Padre Francisco José, de Fortaleza – CE.
Alegre e radiante nasceu uma vez mais o dia da Santa
Páscoa, dispensando alegrias, consolos, regozijos e a esperança de vida para
todos os fiéis, a despeito da pesada atmosfera que prevalece em nosso mundo,
causada por uma crise multidimensional com todas as suas conhecidas e dolorosas
conseqüências para nossa vida cotidiana.
Cristo ressuscitou do túmulo, o Deus-Homem, e a
humanidade ergueu-se com Ele! A tirania da morte agora pertence ao passado. O
desespero perante o cativeiro no mundo dos mortos está irrevogavelmente
destruído. O Uno e Poderoso Vivificante, através de sua Encarnação,
voluntariamente assumiu a miséria de nossa natureza e tudo que ela traz, isto
é, a morte, e assim «trouxe morte ao Hades pelo relâmpago de Sua Divindade»,
concedendo-nos a vida – e «vida em abundância». (Jo 10, 10)
Esta abundância de vida, que nos foi concedida pelo
Senhor Ressuscitado é incessantemente caluniada e atacada pelo demônio – de
fato, tais ações são a origem do seu nome – embora ele esteja agora
enfraquecido, completamente sem poder e inteiramente ridículo. O demônio
calunia a Vida através da hubris que ainda prevalece no
mundo contra Deus, a humanidade e a criação. O demônio ataca a Vida através da
tendência ao pecado que existe em nós como «ferrugem velha», usando-a para
enredar-nos, seja em algum pecado tangível ou em alguma fé ilusória. A hubris é
produto daquela «ferrugem», e ambas compõem a sinistra dupla responsável pela
perturbação dos relacionamentos conosco mesmo, com os outros, assim como com
Deus e toda a Criação. Igualmente, é imperativo que purifiquemo-nos desta
ferrugem com grande atenção e cuidado, para que brilhe intensamente em nossa
mente, alma e corpo, a luz vivificadora do Cristo Ressuscitado, dispersando as
trevas da hubris e vertendo a abundância da vida para todo o mundo.
Isto não pode ser alcançado através da filosofia, da
ciência, da tecnologia, da arte ou de qualquer ideologia; só pode ser alcançado
através da fé na Paixão, Crucifixão, Sepultamento, Descida ao mundo dos mortos
e Ressurreição dentre os adormecidos do Deus-Homem Jesus Cristo; fé esta,
expressa em uma vida imersa nos Mistérios da Igreja, assim como através de uma
laboriosa e sistemática luta espiritual. A Igreja, sendo o Corpo de Cristo,
vivencia incessantemente e através dos tempos o milagre da Ressurreição.
Através dos sagrados Mistérios, de sua Teologia e de seus ensinos práticos, ela
nos oferece a possibilidade de participar neste milagre, de compartilharmos da
vitória sobre a morte, de nos tornarmos filhos moldados pela luz da
Ressurreição e verdadeiramente «coparticipantes da natureza divina» (2 Pd 1,
4), assim como na vida de cada santo do passado e do presente. As ervas
espinhosas das paixões crescendo nas profundezas de nosso coração, poluído pela
ferrugem do «homem velho» (Ef 4,22) devem ser definitivamente transformadas o
quanto antes em buquês de virtudes, santidade e correção em Cristo, através de
Cristo e por amor de Cristo e de suas imagens vivas que nos cercam – isto é, os
demais seres humanos.
Assim sendo, o santo hinógrafo oportunamente canta:
«Vistamos o manto de justiça, que é mais branco que a neve, e rejubilemos hoje
no dia da Páscoa; pois Cristo, o Sol de Justiça que se ergue dos mortos,
derramou sobre nós a luz da incorrupção». A veste branca de justiça nos
foi dada simbolicamente no dia do nosso Batismo; e nós somos convidados a
mantê-la constantemente limpa através do contínuo arrependimento, controle dos
nossos desejos, paciência diante das dores da vida, e incansável esforço no
cumprimento dos mandamentos de Deus, e especialmente no mandamento supremo do
amor. Deste modo, seremos capazes de participar no auto-esvaziamento da Cruz do
Deus-Homem e, igualmente, na alegria Pascal, na luz radiante e ditosa salvação
que entrarão em nossa vida.
Escrevemos-vos esta carta desde o Fanar, onde
experienciamos o sofrimento da Sexta-Feira Santa e a luz da Ressurreição, e
expressamos-vos a afeição da Igreja Mãe, de todo o coração desejando a todos o
dom salvífico e a bênção Pascal do Senhor da Vida, que ressuscitou dos mortos.
SANTA PÁSCOA.
Fervoroso suplicante por todos diante do Senhor
Ressurrecto,
† BARTOLOMEU de Constantinopla
† BARTOLOMEU de Constantinopla
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