Jovens cearenses de 12 assentamentos viajam pelo
País, contando suas histórias em documentários
Os moradores do assentamento "Todos os Santos", localizado no
município de Canindé, distante cerca de 110 Km de Fortaleza, escolheram a arte
e a cultura para reconstruir suas vidas. No entanto, quando viam suas histórias
contadas, em produções audiovisuais, constatavam que não faziam jus à
realidade. "A gente resolveu filmar as nossas histórias", justifica
Emanuel Rodrigues, 26 anos, que desde 2011 participa do projeto "A nova arte
de se comunicar nos assentamentos".
Pioneira no País, a iniciativa, segundo afirma Cláudia Cavalcante,
coordenadora e idealizadora, começou em 2009, mediante parceria entre a
Academia de Ciência e Artes (Acartes), Organização Não-Governamental (ONG) localizada
no Pirambu; e o projeto Arte e Cultura, do Instituto Nacional de Colonização e
Reforma Agrária (Incra). A partir de sexta-feira (6), jovens realizadores de
cidades do Ceará, a exemplo de Emanuel Rodrigues, percorrerão seis estados
brasileiros para mostrar 12 documentários produzidos nas suas comunidades. As
exibições começam em Abaetuba, no Pará, sendo realizadas oficinas de iniciação
à produção audiovisual. O objetivo é partilhar o processo de trabalho, iniciado
no Ceará, tendo a arte como fio condutor.
A Acartes integra o programa Pontos de Cultura, sendo responsável pela
realização de oficinas para que os jovens, que até então não tinham contato com
o audiovisual, pudessem desvendar os segredos dessa linguagem artística.
Durante dois meses, jovens dos assentamentos Barra do Leme, em Pentecoste;
Lagoa do Mineiro (Itarema); Tiracanga e Todos os Santos (Canindé); Cachoeira do
Fogo (Independência); Recreio (Quixeramobim); Coqueirinho (Fortim); projeto Verde Vida (Crato); Barra do Feijão e
Santana (Monsenhor Tabosa) terão oportunidade de trocar experiências com outros
moradores de assentamentos Brasil afora.
Na bagagem, além da vontade de mostrar como são capazes de assinar
produções que retratam a realidade do dia a dia, o desejo de ampliar a ideia.
Segundo Cláudia Cavalcante, participam dois representantes de cada um
dos 12 assentamentos, explicando que o objetivo do projeto "é dar uma
visão de dentro para fora, já que eles sempre tiveram as imagens captadas por
outras pessoas".
Os documentários têm duração de 20 minutos e relatam a vida dos
moradores: suas lutas e conquistas. Em alguns dos assentamentos, como é o caso
de "Todos os Santos", a comunidade se identifica com a arte. Emanuel
Rodrigues fala sobre a companhia de teatro Carrapicho, coordenada pela
moradora, Margarida Rodrigues, que atua há 16 anos na comunidade.
"Nossa estética parte da discussão sobre a realidade local",
revela. Os jovens do assentamento são identificados com as manifestações
culturais, citando o circo e o cordel. Os trabalhos também refletem sobre
questões políticas e sociais, aproveitando para difundir a arte do campo.
A mostra acontecerá de hoje ao dia 9 de março, no Pará, primeiro estado
a receber o projeto. Depois, percorrerá os estados do Maranhão, Bahia, Minas
Gerais e Goiás, durante os meses de março e abril.
Após a circulação nacional, será realizado um seminário, em Fortaleza,
com todos os integrantes do projeto, que conta com apoio também do Ministério
do Desenvolvimento Agrário (MDA), parceria firmada em 2010 e também o Banco do
Nordeste do Brasil (BNB).
A trajetória do projeto começa em 2009, com o objetivo de formar jovens
produtores nos assentamentos. Inicialmente, o enfoque maior era na parte
técnica. A parceria com o MDA possibilitou a formação de comunicadores populares.
O próximo passo foi a elaboração do roteiro para os 12 documentários,
tendo como foco principal, a história desses assentamentos. "São histórias
vitoriosas", complementa Emanuel Rodrigues, que resolveu ir para trás das
câmeras, cansado de ver a vida da comunidade retratada de forma que considerava
não corresponder com os fatos reais. Em 14 minutos, o curta retrata a saga dos
moradores do assentamento "Todos os Santos", que mistura luta e
momentos de alegria também.
Além da sede do Pirambu, a Acartes mantém a cidade cenográfica em
Itaitinga, cidade da Região Metropolitana de Fortaleza (RMF) onde foram
realizadas as oficinas de preparação dos produtores. De lá saiu também o longa
"Poço de Pedra".
Os produtores, que começaram aos 15 anos, hoje, são adultos, mas
continuam cultivando o sonho de fazer arte. Cláudia Cavalcante Damasceno
ressalta a importância da descoberta da arte na vida desses jovens. Basta uma
rápida conversa com um deles para perceber essa transformação.
O sentimento de pertença é percebido de imediato. Os jovens passam a
compreender podem interferir na realidade e fazer arte com ela também.
"Eles fazem o roteiro, captam as imagens e editam os vídeos", observa
a idealizadora do projeto. A proposta do projeto é difundir, para o restante do
País, a experiência audiovisual que vem acontecendo no Estado.
Iracema Sales
Repórter
Repórter
Fonte: Caderno 3 – Diário do
Nordeste (06/ 03/ 15)
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